Neologismos – o que são, como surgem, como deixar de ser?

Dia desses um ex-aluno me fez a pergunta que deu origem ao título do artigo de hoje. A propósito da criatividade do seu filho, o genial Otávio, ele ficou curioso sobre o processo de ampliação do léxico oficial e como as ‘invenções’ fazem parte disso tudo.

Comecemos entendendo o termo: neologismo é uma palavra nova, que pode ser criada pelos usuários do idioma de diferentes maneiras:

  • pela junção de palavras ou ‘pedaços’, dentro da lógica da língua (empregando possibilidades que a própria língua oferece, como prefixos e sufixos);
  • pela elipse de termos dentro de uma expressão;
  • pela ‘invenção’ de termo para ‘batizar’ uma inovação tecnológica, a qual precisará de designação.

“Para que o uso do neologismo se torne efetivo, é preciso que, além de partir das pressões sociais, o sistema linguístico esteja apto a absorvê-lo”1, de acordo com a Dra. Nelly Medeiro de Carvalho, professora da UFPE. Ou seja, ele precisa seguir os padrões gerais do idioma, pois a língua, por meio do conjunto de seu vocabulário que a liga ao mundo exterior, reflete a cultura de toda uma sociedade, que a emprega como meio de expressão, para obter a comunicação.

Do primeiro tipo, aquele que emprega as possibilidades do idioma, temos, por exemplo, o utilíssimo verbo coisar! Que nunca “coisou” algum negócio? Temos aqui a criação de um verbo pela junção do sufixo ‘ar’ ao substantivo ‘coisa’. É o que o Tom Zé faz na canção “Esteticar (estética do plágio)” com os termos ‘blacktie’ e ‘smoking’ (estrangeirismos):

(…) Se segura milord aí que o mulato baião
(tá se blacktaiando)
Smoka-se todo na estética do arrastão(…)
https://www.vagalume.com.br/tom-ze/esteticar-estetica-do-plagio.html

Ou os jornalistas que vêm acompanhando há algum tempo os casos de corrupção em diversos escalões do governo, quando cunharam os termos ‘mensalão’ (pagamento mensal, mensal-, de grande valor, –ão) e ‘valerioduto’ (Marcos Valério era a pessoa que levava o dinheiro + duto, termo que indica via por onde algo passa). Na mesma linha, aproveitando termos já existente no idioma, temos o ‘namorido’, para denominar o rapaz que se encontra num relacionamento semelhante ao casamento, palavra criada por aglutinação dos termos namorado + marido.

Com a chegada das estações mais quentes, muitas pessoas já planejam a compra de um ar-condicionado, certo? Na verdade, o termo completo é aparelho de ar condicionado2, mas já fizemos a elipse do termo aparelho, como já havia acontecido com o veículo/carro automóvel: ou usamos veículo, carro ou automóvel, mas esse último termo era apenas o adjetivo que caracterizava o modo como o veículo se movimentava (por si mesmo, sem tração animal).

Os termos novos são também resultado da criatividade humana nos outros campos. Os neologismos criados no setor artístico, científico e tecnológico têm o objetivo de oferecer novos conceitos dentro dessas áreas e acompanhar a evolução humana. A informática talvez seja, atualmente, uma das maiores fornecedoras de termos, pois sempre precisaremos fazer um ‘backup’ (usamos o termo estrangeiro mesmo), então, para diminuir o risco de perdermos informações importantes, devemos becapear(!!!) os arquivos com frequência; é bom ‘zipar’ os arquivos, para ocuparem menos espaço… Assim, a partir do estrangeirismo, que passou a neologismo, ainda fizemos mais um ‘abrasileiramento’ do termo e ele virou verbo!

Já o processo de dicionarização de um neologismo reflete a continuidade de seu uso na comunidade linguística, a sua aceitação. Depois de algum tempo tendo seu uso registrado pelos dicionaristas, comprovada a existência, permanência e uso, a Academia Brasileira de Letras acaba incorporando o vocábulo no VOLP (Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa) e eis que oficialmente temos mais uma palavra no idioma.

É isso! Até a próxima semana!


1e-revista.unioeste.br/index.php/trama/article/download/681/574
2Quanto ao emprego do hífen nesse trecho, temos diferenças:  a grafia com hífen designa o aparelho também chamado de “condicionador de ar” (“Desligue o ar-condicionado”); se a construção for “aparelho de ar condicionado” ou “sistema de ar condicionado”, não se usa o hífen.

 


Margarida Moraes é formada em Letras pela Universidade de São Paulo (USP). Com mais de 20 anos de experiência, corretora do nosso Curso de Redação Online (CLIQUE AQUI para saber mais) e responsável pela resolução das apostila de Linguagens e Códigos do infoEnem, a professora é colunista de gramática do nosso portal. Seus textos são publicados todos os domingos. Não perca!

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