No último dia 25 de junho, o programa de entrevistas Roda Viva, da TV Cultura, entrevistou a pré-candidata à Presidência da República Manuela D´Ávila, filiada ao Partido Comunista do Brasil (PCdoB), e tal participação repercutiu muito na mídia como um todo e nas redes sociais, pois muitos telespectadores acharam que Manuela D´Ávila foi interrompida diversas vezes pelos entrevistadores, homens e mulheres, configurando, em muitas ocasiões, o manterrupting.
Um dos momentos que mais repercutiu nas redes sociais foi quando a pré-candidata foi questionada por Frederico D´Ávila – um dos coordenadores da campanha do também pré-candidato à Presidência da República Jair Bolsonaro (PSL) – sobre a punição de estupradores por meio da castração química. Esse momento do programa destacou-se por, primeiro, o entrevistador quase não deixar a entrevistada responder a sua perguntar (e por ele ser o coordenador de campanha de outro pré-candidato) e pelo tema da pergunta em si, a castração química.
A castração química é um argumento recorrente na fala do pré-candidato Jair Bolsonaro, pois ele criou, em 2013, um projeto de lei na Câmara dos Deputados, em Brasília, que a coloca como punição para estupradores. Em 2016, o projeto estava tramitando na Câmara dos Deputados, mas, até agora, não foi votado; parece ter sido engavetado.
Manuela D´Ávila, no Roda Viva, ao tentar construir seu raciocínio, tentou argumentar que devemos acabar com a cultura de estupro no Brasil, ensinando e conscientizando os homens de que o estupro não tem justificativa e que não deve ser incentivado como punição a nenhuma mulher e que a vítima nunca é culpada pela violência sexual.
Afinal, a castração química seria uma alternativa viável para inibir estupradores e, assim, diminuir o número de estupros no Brasil? A coluna da Redação no Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) de hoje é sobre isso, abordando tal questão como um tema pertinente para a prova de redação do Enem de 2018.
Pessoalmente, como professora de Redação que acompanha a prova de produção textual do Enem há anos, não acredito que esse seja, realmente, uma opção de tema para a banca elaboradora do exame, mas ele pode ser a escolha de outros vestibulares.
A castração química, segundo o médico urologista Alex Meller, em matéria do portal de notícias UOL, é um método que bloqueia a testosterona (aqui, candidato ao Enem, vale estudar hormônios em Biologia), diminuindo o desejo sexual e até a ereção (também vale, aqui, estudar reprodução humana em Biologia).
Segundo Meller, a castração química pode ser realizada por meio do uso de dois tipos de drogas. Um deles funciona inibindo a produção de testosterona e o outro tipo de droga engana o corpo do homem ao estimular altos níveis de produção hormonal e, assim, a produção natural é inibida.
Ainda de acordo com Meller, há drogas de uso oral e injetável e a posologia depende do paciente e, além disso, é um tratamento caro; há injeções, por exemplo, que custam R$ 3.000,00 reais.
Na mesma matéria também foi entrevistado o médico psiquiatra Danilo Baltieri no que concerne o termo “castração química”. Para ele, trata-se de um termo mais jurídico do que científico, pois é uma diminuição dos impulsos sexuais, não uma privação completa.
E é nesse sentido que muitas pessoas defendem que a cultura do estupro deve acabar e não apenas colocar a castração química como mais uma forma de punição aos estupradores.
Segundo o médico urologista Eduardo Ribeiro, professora da Universidade de Brasília (UnB), quando a castração química é feita o impulso sexual diminui, mas não necessariamente o interesse sexual também diminui, pois ela não muda a ideologia violenta do indivíduo que estupra. Isto é: mesmo sem ereção, o estupro e a violência sexual podem acontecer de outras maneiras, como por exemplo, usando pedaços de madeira, ferro, bambu ou cana de açúcar para penetrar a vítima, como já foi noticiado pela mídia.
Além disso, de acordo com o Código Penal brasileiro, o crime de estupro não se configura apenas pela penetração, mas é sim todo ato sexual (ato libidinoso) não consentido pela vítima, de acordo com a Lei 12.015, de 7 de agosto de 2009.
Nesse sentido, podemos citar como exemplo o caso do assassino e estuprador Francisco de Assis Pereira, o Maníaco do Parque, que atuava em São Paulo e que matou e estuprou seis mulheres e que, comprovadamente, não tem ereções. Não foram encontradas amostras de sêmen nas suas vítimas, mas ele as violentou de outras formas.
O estupro é um crime que busca dominar, humilhar e subjugar a vítima por meio da violência sexual, que pode ser dada sem penetração, ou seja, sem ereção por parte do estuprador que, normalmente, culpa a vítima. Ou seja, trata-se mais de uma questão psiquiátrica do que hormonal, ou não só hormonal.
Também não podemos esquecer que a maioria dos estupros no Brasil acontece entre pessoas próximas. A grande maioria dos estupradores são pessoas próximas às vítimas, inclusive de suas famílias; a menor parte dos casos é cometida por um estranho, nas ruas, como no caso do Maníaco do Parque.
Esperamos que o texto de hoje sirva de base para estudos e reflexões por parte dos candidatos ao Enem e de outros vestibulares sobre esse tema tão complexo e polêmico.
Até a próxima semana!
*CAMILA DALLA POZZA PEREIRA é graduada em Letras/Português e mestra em Linguística Aplicada pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Atualmente trabalha na área da Educação exercendo funções relacionadas ao ensino de Língua Portuguesa, Literatura e Redação. Foi corretora de redação em importantes universidades públicas e do Curso Online do infoEnem. Além disso, também participou de avaliações e produções de vários materiais didáticos, inclusive prestando serviço ao Ministério da Educação (MEC).
**Camila é colunista semanal sobre redação do nosso portal. Seus textos são publicados todas as quintas!