Na última semana, analisamos a proposta de redação do Enem 2016 – “Caminhos para combater a intolerância religiosa no Brasil” – e um leitor comentou e publicou com uma opinião pessoal sobre o Estado laico e sobre a análise propriamente dita. O leitor, ao qual agradecemos o comentário, alegou que o candidato, no momento do exame, não tem tempo hábil para analisar profundamente e detalhadamente a coletânea de textos motivadores antes de escrever o texto.
Porém, este não é o comportamento esperado pelos professores de Língua Portuguesa e de Redação e pelas bancas elaboradora e corretora do Enem e de qualquer vestibular, já que todos os exames traçam um perfil do candidato ideal; no caso do Enem, o candidato nota 1.000.
Ao contrário do que argumenta o leitor, há tempo suficiente para que o candidato leia e analise, com uma certa calma, todos os textos motivadores da prova de redação do Enem. Para isso, o candidato deve ir além da administração do tempo; ele precisa acessar, no momento do exame, o seu conhecimento prévio adquirido ao longo do tempo e da sua formação, na escola e fora dela, sobre o tema da proposta de redação.
Nesse sentido, o candidato que ao longo de toda a sua vida cultivou o hábito e o prazer pela leitura, não só de textos escolares e didáticos, mas também de jornais, revistas, portais de notícias, livros, dentre outros, consegue analisar, de maneira adequada, todos os textos motivadores da coletânea do Enem e, assim, estabelecer relações com outras áreas do conhecimento fora aquelas abordadas pela prova de redação, como fizemos na nossa análise.
O candidato que, por sua vez, não consegue construir relações entre o tema e questões sociológicas, políticas, filosóficas etc. não se preparou adequadamente para a prova de redação do Enem, infelizmente. E isso vale para os demais vestibulares.
Obviamente que há temas mais fáceis para a grande maioria porque possuem mais visibilidade na mídia, mas não devemos nos agarrar a isso quando vamos estudar os prováveis temas para uma prova de redação. Aliás, às vezes, perde-se muito tempo tentando adivinhar qual será o tema, pois de nada adianta conhecer bem o tema, mas escrever sem dominar a norma culta, sem coesão ou coerência etc.
Por fim, eis aí uma das importâncias de se criar nas crianças, desde cedo, o hábito da leitura para que elas construam, no decorrer da vida, um conhecimento prévio e um repertório diversificado sobre os mais variados temas a fim de, inclusive, estabelecer relações entre eles, como fizemos na análise entre intolerância religiosa e racismo, por exemplo, num país tão miscigenado no qual os índios foram catequizados à força pelos jesuítas portugueses.
Desta forma, os candidatos ao Enem precisam almejar se tornar candidatos nota 1.000 a fim de, rapidamente, analisar profunda e detalhadamente uma gama de textos para sustentar seus argumentos. O candidato ideal existe e ele é o que passa pela peneira do massacre que é um Enem ou qualquer outro vestibular; tais exames são massacres, pois os candidatos que não são nota 1.000 são barrados logo no começo da seleção e não passam por mais uma peneira da vida, infelizmente.
*CAMILA DALLA POZZA PEREIRA é graduada em Letras/Português e mestra em Linguística Aplicada pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Atualmente trabalha na área da Educação exercendo funções relacionadas ao ensino de Língua Portuguesa, Literatura e Redação. Foi corretora de redação em importantes universidades públicas. Além disso, também participou de avaliações e produções de vários materiais didáticos, inclusive prestando serviço ao Ministério da Educação (MEC).
**Camila é colunista semanal sobre redação do nosso portal. Seus textos são publicados todas as quintas!