Antes de iniciar o texto desta semana, gostaria de responder alguns comentários sobre a publicação da semana passada (veja aqui). Alguns leitores criticaram um possível desconhecimento de minha parte a respeito da história do Brasil e da educação brasileira. Acerca disso, eu pressupus que os leitores entenderiam que, num artigo, não há espaço suficiente para abordar, de maneira profunda, toda uma complexa história educacional. Meu erro. Eu deveria ter ressaltado que não haveria espaço para tal aprofundamento.
Não para provar meu conhecimento, pois não preciso disso, mas para quem quiser ler mais sobre o assunto, sugiro alguns trabalhos acadêmicos (dissertações de mestrado, teses de doutorado, livros e artigos científicos) que abordam a história da educação no Brasil em relação, especificamente, ao ensino de Língua Portuguesa, que é minha área de pesquisa e atuação:
- Bunzen Junior, Clecio dos Santos. Livro didático de língua portuguesa : um gênero do discurso.
- Bunzen Junior, Clecio dos Santos. Dinâmicas discursivas na aula de português : os usos do livro didático e projetos didáticos autorais.
- CHERVEL, A. História das disciplinas escolares: reflexões sobre um campo de pesquisa. Teoria e Educação, Porto Alegre, n. 2, 1990, p. 177-229.
- CURY, C. R. J. O Plano Nacional de Educação de 1936/1937. In: VII Seminário Brasileiro de História da Educação, 2013, Cuiabá. Circuitos e fronteiras na história da educação brasileira, 2013. p. 1-15. Disponível em http://sbhe.org.br/novo/congressos/cbhe7/pdf. Acesso em 18/01/2016.
- FUNDAÇÃO CARLOS CHAGAS. As Propostas Curriculares Oficiais. São Paulo: 1996.
- HILSDORF, M. L. S. História da Educação Brasileira: Leituras. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2005.
- HORTA, J. S. B. O hino, o sermão e a ordem do dia: a educação no Brasil (1930-1945). Rio de Janeiro: UFRJ, 1994.
- Pereira, Camila Dalla Pozza. Concepções de letramento em dois currículos oficiais prescritos (DF e MT) : uma análise crítica
- ROMANELLI, O. O. História da Educação no Brasil. 21ª ed. Petrópolis: Vozes, 1998.
- SOARES, M. Concepções de linguagem e o ensino da língua portuguesa. In: BASTOS, N. B. (org.). Língua Portuguesa: história, perspectivas, ensino. São Paulo: Educ, 1998, p.53-60.
- ZOTTI, S. A. Sociedade, Educação e Currículo no Brasil: dos jesuítas aos anos de 1980. Campinas: Autores Associados; Brasília: Editora Plano, 2004.
Um outro tipo de mensagem que gostaria de comentar brevemente são aqueles que criticaram o texto ou me criticaram, mas ficaram na crítica rasa (como um “pires”), sem argumentos desenvolvidos. Essas pessoas parecem não ser leitoras da coluna, pois desde que escrevo para o Portal infoEnem bato na tecla da argumentação embasada em estratégias argumentativas. Na ausência destes, o debate morre, pois não vou responder a críticas vazias, de cunho pessoal, e sem nenhuma argumentação.
Em outras ocasiões, respondi a comentários, inclusive negativos, de leitores, mas estes o fizeram de maneira educada e desenvolvida, expondo os argumentos que embasavam suas opiniões.
Portanto, caros leitores, os quais respeito profundamente, opinião e ponto de vista fundamentados não servem apenas para se tirar uma nota alta na prova de redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), mas são úteis e necessários em todas as esferas sociais da vida, até em comentários em um site ou para uma colunista.
Possível Tema da Redação Enem 2017 – Respeito versus Tolerância
Agradeço ao espaço antecipadamente concedido e, agora sim, vamos ao texto de hoje que até, inclusive, tem a ver com o que escrevi acima. Falaremos hoje sobre respeitar versus tolerar como um possível tema para a prova de redação do Enem 2017 porque, a cada dia que passa, somos testemunhas ou nos envolvemos em situações nas quais não há tolerância nem respeito pelo outro ou pelas opiniões deste outro.
Segundo o dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, “tolerar” significa suportar algo ou alguém que é agressivo, indesejável; consentir, admitir, permitir e não impedir; aturar-se reciprocamente. Por outro lado, de acordo com o mesmo dicionário, “respeitar” significa ter respeito, deferência por algo ou alguém, ter consideração; reconhecer; ter cuidado.
Esta simples consulta ao dicionário nos faz perceber claramente que o ideal é respeitar as pessoas e tolerar seria o mínimo para a convivência pacífica em uma sociedade.
Em meio a debates acalorados nas redes sociais, nos almoços e jantares de famílias, nas reuniões entre amigos e nas pausas com os colegas de trabalhos estamos testemunhando e até nos envolvendo em situações nas quais não há tolerância e muito menos respeito. Não que não devemos discutir ideias, pois estas estão aí justamente para serem debatidas, questionadas, discutidas e daí então acatadas ou não. O que não devemos fazer é faltar com o respeito para com as pessoas que pensam diferente de nós.
E quando há falta de respeito normalmente o debate enveredou para a esfera individual e pessoal, ou seja, foi para o lado pessoal e daí toda discussão cessa, isto é, acaba.
Aliás, este é um dos temas das propostas de redação do Curso de Redação Online do infoEnem, com a proposta “Da intolerância ao respeito: como fazer esta mudança?“. Vivemos em uma democracia na qual há liberdade de expressão e na qual não deve haver opressão em relação a ela e neste campo entra em debate as ideias e, nesta seara, há discussão do que é de bom ou de mau gosto, por exemplo.
Podemos conviver com alguém que pensa diferente de nós? Sim, podemos e devemos, pois assim exercemos nossas habilidades de argumentação, persuasão, paciência, tolerância e respeito por meio do embasamento de nossas opiniões e de nossos pontos de vista. Caso o pensamento diferente não fira a lei, nada mais a fazer do que isso. Agora, se o pensamento distinto ferir a lei e incentivar racismo, homofobia, misoginia e demais atos ilegais daí estamos tratando de discursos de ódio e não de liberdade de expressão e estes sim devem ser combatidos, assim como o desrespeito aos direitos humanos na prova de redação do Enem.
Críticos do exame apontam que o critério de respeito aos direitos humanos na prova de redação do Enem fere o direito à liberdade de expressão, pois os candidatos deveriam escrever o que a prova pede, mas não. O respeito aos direitos humanos como critério de avaliação e correção numa prova de redação só mostra que este exame, no caso, o Enem, almeja futuros alunos universitários que respeitem a dignidade humana e que saibam conviver com as diferenças, ou seja, no mínimo, tolerar o outro.
Gabriela Araújo, ex-corretora do Enem e coordenadora de um grande colégio do interior de São Paulo afirmou em entrevista que:
Você pode se posicionar com uma visão diferente da coletânea da prova, mas a pessoa não pode dizer que xingar ou se posicionar de forma agressiva contra uma outra pessoa é liberdade de expressão. Há um limite entre liberdade de expressão e crime. Os direitos humanos protegem humanos de outros seres humanos, respeitar isso na redação é o mínimo que se espera de um aluno.
A partir de 2013, o desrespeito à competência número cinco pode resultar em anulação da dissertação-argumentativa, o que resultou em 955 redações anuladas por este motivo em 2014; já no ano de 2016, juntando as duas edições do Enem, este número saltou para 4.798 redações anuladas por ferirem os direitos humanos.
Obviamente que a tolerância e o respeito, que seria o ideal, devem ser praticados além do Enem e, assim, devem ser levados para a vida e para todas as esferas de convivência social (escolar, do trabalho, familiar, das relações íntimas etc).
Como promover esta mudança? Como passarmos da tolerância para o respeito? Será que um dia alcançaremos este patamar? Espero sinceramente que sim.
*CAMILA DALLA POZZA PEREIRA é graduada e mestranda em Letras/Português pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Atualmente trabalha na área da Educação exercendo funções relacionadas ao ensino de Língua Portuguesa, Literatura e Redação. Foi corretora de redação em importantes universidades públicas. Além disso, também participou de avaliações e produções de vários materiais didáticos, inclusive prestando serviço ao Ministério da Educação (MEC).
**Camila é colunista semanal sobre redação do nosso portal. Seus textos são publicados todas as quintas!
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“Educação cabe em qualquer lugar”!