Sinonímia: existem palavras que significam exatamente a mesma coisa?

O senso comum (aquele que não deve ser usado para fundamentar a argumentação nos textos dissertativos, como bem explica a profª Camila neste artigo) costuma apresentar os sinônimos como palavras que apresentam o mesmo significado.

Segundo o Dicionário Eletrônico Houaiss: “diz-se de ou palavra que tem com outra uma semelhança de significação que permite que uma seja escolhida pela outra em alguns contextos, sem alterar a significação literal da sentença”. Trocando em miúdos: os termos têm quase o mesmo significado. Vejamos o emprego de dois termos sinônimos neste texto de Bocage:

“Assim como as flores vivem
A minha Lília viveu;
Assim como as flores morrem
A minha Lilia morreu.
(…)

Em parte da minha essência
Minha essência pereceu;
Não vivo senão metade:
A minha Lilia morreu.(…)”

O poeta empregou “morrer” e “perecer” para indicar a ‘extinção da existência’. Poderia ainda ter optado por expirar, falecer, entregar a alma ao Criador (lançando mão de um eufemismo) ou ainda esticar as canelas, bater as botas (usando construções disfêmicas – só para lembrar: disfemismo é o oposto de eufemismo).

O que impossibilita a simples substituição de uma por qualquer outra das demais são pequenas nuances no significado, nuances essas que podem estar relacionadas ao sentido ou ao grau de formalidade da situação em que serão empregadas. Analisemo-las então:

  • Morrer – é o termo mais genérico, indicando ‘deixar de viver’;
  • Perecer – este termo implica violência ou sofrimento;
  • Falecer – costuma ser mais formal

No trecho do poema, existe a ideia de sofrimento, o que justifica a escolha do perecer, e não do falecer, para referir-se à essência, à alma do eu-lírico. Como o texto tem alto grau de lirismo, os eufemismos também seriam adequados.

Os eufemismos e disfemismos relacionados à ideia de morrer são em número tão grande que poderíamos ocupar todo o espaço desta coluna com eles: ‘descansar’, ‘ir para o céu’, ‘virar anjinho’, ‘virar estrelinha no céu’ no caso de uma pessoa benquista; já para as não tão queridas encontramos ‘abotoar o paletó’, ‘vestir o paletó de madeira’, ‘comer grama pela raiz’, ‘amassar o barro com as costas’, ‘ir para a cidade dos pés juntos’ e outras tantas, numa lista tão grande quanto a criatividade das pessoas.

Portanto, quanto mais amplo for o vocabulário do emissor, menor a chance de empregar um termo inadequado ao contexto. E, por outro lado, quanto mais vasto (observe que não repeti o termo ‘amplo’) o conhecimento léxico do receptor, menos dificuldades este terá na compreensão e interpretação de textos. E, não custa lembrar, essa ampliação de repertório depende de leitura e de consulta ao velho e bom dicionário.

Até a próxima semana!


Margarida Moraes é formada em Letras pela Universidade de São Paulo (USP). Com mais de 20 anos de experiência, corretora do nosso Curso de Redação Online (CLIQUE AQUI para saber mais) e responsável pela resolução das apostila de Linguagens e Códigos do infoEnem, a professora é colunista de gramática do nosso portal. Seus textos são publicados todos os domingos. Não perca!

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